quinta-feira, 20 de março de 2014

368. Esconderijos e vergonhas



Silenciosa
Amedrontada
Acuada
A loucura fica, é faca
Que fere o coração
Me asilo me abrigo
Enquanto minha carne delira
Enquanto minha pele suspira
adoece, amolece, apodrece

Vergonha anunciada
denunciada  renunciada
Na calada da noite ou
Na clandestinidade dos dias
O tempo desperdiçado deixa marcas
Passa nos meus olhos pele boca cabelo cores  e sorriso
Desbotando sabotando
Tudo....

Silenciosamente me recolho
Pra não alardear minha insana idade
Do meu sigilo escapam ruídos
Alego males do corpo
Pra camuflar a alma
Pra desdenhar a sina
Pra desfocar a mira

Provoco  a ira dos deuses
Que em silêncio reconhecem meus pecados
E me condenam
E me abominam

Minhas mucosas esfoladas ardem
Sangram
Escorrem fluidos infectos ilegalidades obscenidades
Que minam de dores intumescidas e cavidades edemaciadas
De abominações gestadas nas ondas elétricas
Que caminham pelo tecido neural
recolhendo horrores  metálicos...

Paro e não sei mais de onde eu vim.
Em que ponto me desviei?
Que marcas e sinais, ignorei?

Qual é o sentido de permanecer imune e triunfar?
Qual o sentido de se deixar perder e revelar?
Qualquer caminho leva ao remorso e ao arrependimento
As dores são inevitáveis
Porque as escolhas não aceitam perdão

MDansa

367. Correndo sem sair do lugar


Alguma força ressurge
me empurra
me faz querer correr
Cada vez mais.... 
Sangue e músculos se esforçam
consomem ares carregados de mágoas
E mesmo assim, extasiados
Movem-se acelerando
Chegando ao esforço máximo
Corro enlouquecida
enquanto meu combustível se esgota
eu...consumida
Cérebro anaeróbico entontece e desmaio
Por ruas vazias de esperança 
Sinto dores musculares
em fibras ácidas atrofiadas tetânicas...
mas jamais saí do lugar.

MDansa

366. Realidade Fantástica


Como estes dragões chegaram até aqui?
Eles me atingiram e golpearam pelas costas
Respingaram suas gotas venenosas
Em enxurradas lavras vivas
alegorias
Que me arrebataram
Que me arrebentaram
que me arremessaram
que me derrubaram
que me incineraram
que me derrotaram
que me tonalizaram o vermelho de um sangue
Suaves traços de paixão
Pra confundir vida e morte
Em minhas vestes
E ultrapassar todos os limites do entendimento
Nada é o que parece
Tudo poderia  ser  vivido
Tudo poderia  ser possível
Tudo poderia ser imaginado
Fantasias intrusas
Marcos geográficos viajantes itinerantes
Referências que mudam de lugar
Desmistificando o que eu quero, o que é certo
E o que é erro
Tudo parece tão factível e perfeito
Tão triste e torpe
Tão real e distorcido
Tão dramático...

Vou sentindo uma perturbação
Ao meu redor
Ao que não se move do lugar e ali permanece
(ou só me acostumei a pensá-lo ali?)
Recrio imagens  sagradas com o canto de olhos...
Os lugares mudam
Eu mudo de lugar
As coisas mudam de mim
Os espaços estão tão diferentes
Das minhas lembranças catalogadas da infância
Vejo que o fantástico é somente o que desconserta minha história
E afrouxa minhas certezas

Relaxo e aprendo tudo de novo


MDansa

sexta-feira, 14 de março de 2014

365. Pressão seletiva



Vou contar pra você
os devaneios que me perseguem
enquanto idéias incomuns preenchem o vazio da minha cabeça

Vou mostrar onde mergulho
E nado, enfim me refrescando
depois de quase perder o fôlego 
Dali vou emergindo, de repente,
Em novas paisagens diurnas mares
Ou novos luares
/surpresas/

A novidade que me desperta de um sono antigo e incurável,
de uma imobilidade crônica...
é o tempo e a vida
(grande novidade...)
Em inumeráveis experiências que brotam do caos do acaso
Ou são testes de deuses procurando a própria superação
Moldam matéria e respostas em um tempo infinito e, portanto, vagaroso e invisível
no espectro que conheço
Variantes, mutantes, combinações incontáveis indecifráveis
Você não pode imaginar quantas possibilidades se escondem neste universo...

Num súbito instante
apressado indelével
buscando silêncio e claridade
Me deparei com o mistério e me debrucei...
Desfiei algumas das possíveis aberrações ocultas
Que  rodeiam e enganam ou chamam ou apenas passeiam como fantasmas
à espera do momento exato
/pulo do gato/

Monstros emergirão de um caos anunciado e óbvio
Questionando as formas viventes e rindo delas

em algum lugar me ditaram este segredo:
Nossas unidades vitais, máquinas amorais
carregam muitas cinéticas clandestinas
Escolhendo às vezes uma às vezes outra.
E, às vezes, exatamente aquela
- entre tantas improváveis esquecidas -
é resgatada...
violentando valores e mudando tudo
de novo
desfazendo, transmutando
desbravando um pequeno e decisivo desafio
virando o jogo
e sobrevivendo ao tempo

Evoluir é, pois, ficar
Fincar
Resistir 
Continuar
Permanecer
Testemunhar 
Vencer
Finalmente triunfar
Depois de tanto fracasso

Por medo, por erro ou escolha
subverter a ordem
é seguir testemunhando o tempo
pois a lei da vida é clara:
Adapte-se agora ou jogue fora toda a eternidade!

MDansa
imagem:http://crispme.com/gorgeous-photography-mikko-lagerstedt/08-eternity/


364. As portas x The Doors

As portas


Já corri, baby
Continuo correndo sem voltar os olhos
Não me siga. Não me diga...
Não enxergo mais relógios
que batem  histórias (com)passadas
em duras badaladas
marcando marchando mancando
Vejo cronômetros
Avisando do tempo decrescente
que ainda tenho

Venderei minhas lantejoulas
As jóias que não penhorei ainda
Todos os artigos publicados em revistas importantes
que pesam agora bem menos que todos os sentimentos acumulados no peito
Venderei carros estacionados
Em vagas de idosos
Esquecidos por demências, decadências, indecências
Doenças amilóides neuronais degeneram meus passos,
minha alma e tudo o mais
Sem que eu possa tentar, sem que eu consiga lutar,
Sem me dar chances
Pra escapar ilesa
Da morte por atropelamento.

Esta confusão quase mental quase letal
Pode ser só o começo do fim
Ou a permissão pra poder errar
Tentar, recusar o mundo
E mergulhar pra dentro, implodindo
ou num universo paralelo, explodindo
Agora só a free mind reconhece
e permite
the last the best option
onde espero enfim encontrar respostas
Que sejam suficientes coerentes finais
que me convençam
e nada mais

MDansa
____________________________________________

The Doors

Você não entendeu, baby.
Nem tentou entender - apenas desistiu,
pois não queria nada deste mundo
Você cuspiu nas regras, baby
viveu com astros girando em torno
Do seu próprio sol
Como se apenas você estivesse vivo irradiando
Experimentando paixões e peiotes
sentidos carnais loucuras
sentimentos vãos pagãos, por pouco sagrados

Você correu tanto, baby, 
que logo engoliu o mundo
como uma loja de doces à sua disposição
Até que seus músculos falharam
E você não pode mais rir deles
Nem copular, nem cantar, nem falar merda
Suas pupilas não se dilataram mais,
Suas papilas saturaram/ gosto/desgosto/
Seu coração entristeceu, apodreceu/ stroke como um trovão arrebatador/
rasgando a cidade sociedade saciedade ansiedade peito
Nenhum dos sentidos nunca mais foi satisfeito
não houve mais prazer...
 
Sem saber como escapar de si mesmo, quase morto
a prisão passou a ser não você, mas o outro
Os limites que se estenderam à sua frente ainda estavam ali
mas agora te negam a passagem :
cavaletes de rotinas e almas penadas
E rituais burocráticos bloqueiam seu caminho

Eles feriram o que restava da sua pele
por trás de tatuagens imaginárias que ainda ardiam
Até que seu próprio corpo e remorso e sofrimento
E fronteiras do mundo físico e astral
Te impedissem  definitivamente

Só então você, derrotado, enxergou a saída
Somente uma e uma única chance de se libertar...
Então...
Foi por ali sem medo
E sem dúvida
e sem parar.

Vai baby, vai morrer.
Só lhe resta estremecer  agonizar
tentar outra solução desconcertante
escandalizante
que rompa a rotina alienada cega insensível
imprevisível
- O mundo nunca mais será o mesmo.

Não que faça diferença, mas
eu continuarei aqui correndo, sem chorar,
tentando, sem pensar...
adiando o final
fugindo da SUA solução banal

Vai baby,,, vai em paz...

MDansa

Depois de ver o filme biográfico do Jim Morrinson (The Doors)
imagem: http://www.camisetascaetano.com.br/loja/products.php?product=Banda-The-Doors-73

363. Segredos de um quarto



Abriram a porta do nosso quarto secreto
E nos surpreenderam
Exercendo amor e fúria
Perversão e ritmo
Compartilhados sincronizados
como uma ária
ou um trovão

Por favor, entrem,
a porta está aberta!
Não vamos amordaçar nosso sexo 
nem nosso grito, nem nossa perdição
Não precisamos nos esconder mais

MDansa

imagem: Beatriz Cresco -  http://www.berlinartlink.com/2012/07/09/beatriz-crespo-portraits/impasse_beatriz_crespo/